terça-feira, 18 de julho de 2006

Mudanças... ... ...

I'm not sure I like what I have become.

Não, não é isso, eu gosto de mim, eu tenho orgulho de mim, mas às vezes... é como se eu não conseguisse de forma alguma compreender por que eu faço o que faço, por que ajo como ajo. Por que quando alguém está sofrendo eu não consigo mais sentir compaixão; por que eu não consigo mais sentir vontade de ajudar. E mesmo quando quero ajudar não encontro ânimo para ajudar, não encontro ânimo para superar minhas próprias dificuldades. E por que não quero mais dar carinho, por que quero preservar meu corpo, me sinto estranhamente invadida quando me tocam, e quero distância de todos. Por que só consigo amar, proteger e dar carinho àqueles que... àqueles que são agora... minha Matilha. Minha Família. Minha Alcatéia.

Eu não sei se gosto da forma como compreendo agora o impossibilidade da perfeição, e a minha própria impureza de corpo, de mente, de alma e de sentimentos. Como compreendo agora a minha crueldade, e como aceito agora a existência do Mal. Não sei se gosto do que existe agora em mim, das cercas de ossos protegendo os jardins do meu castelo, das caveiras intimidadoras que fazem parte do meu brasão. Não sei se quero aceitar a verdadeira função das gárgulas que adornam os altos das torres, e dos gatos-lich que já abandonaram sua função primária de caçar ratos.

Talvez agora, ao passear pela floresta escura que se estende além dos fossos e caminhos, não encontremos mais os velhos demônios cantando suas cantigas de além mar -- mas apenas demônios loucos, perdidos mas certos de saberem onde estão; demônios que agora querem construir coisas, que querem ser algo mais que miragens para os passantes.
Talvez a cã branca agora esteja ocupada cortando-se nos espinhos dos limoeiros, para depois cobrir-se de carvão, na tentativa de criar tatuagens e cicatrizes amargas, tornando-se ela mesma demoníaca. NÃO! A cã ainda olha para os demônios, mas não está latindo agora, O seus pêlos cobertos de sangue tornam seu próprio olhar ameaçador. Todo o castelo está envolto num silêncio aflitivo, e nas cozinhas os seres pequenos - ratos e texugos - inventam formas de transformar as páginas que roubaram da Biblioteca em uma receita nutritiva.
Tudo agora é pequeno e silêncioso - todas as pessoas se transformaram em coisinhas, em aranhas, em libélulas, abelhas e bichinhos de maçã. As plantas começaram a invadir os corredores, pegando carona com o vento que passa pelas janelas. Os andares superiores estão todos vazios, e mesmo a poeira não ousa deitar-se sobre os tapetes e as camas. Nas torres, as plantas e as bruxas estão preparando algo desconhecido. Eu mesma não vou às torres há tanto tempo... Diria até que evito chegar perto do castelo. Passo os dias visitando os amigos, não sempre em seus portentosos navios ou em seus amáveis palacetes, mas também nos casebres em que passam os dias mais tranqüilos... Retiro-me às vezes para um quarto onde não há móveis, nem qualquer forma de vida. O quarto tem cheiro de tempo, de cal e de barro. Encolho-me na frieza do vazio, deito-me sobre um monte de palha e adormeço.

Não sei se ainda quero voltar ao meu velho castelo...

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