domingo, 2 de julho de 2006

Aqui está um caos.

E é bem feito. Ao meu redor as coisas correm normalmente - ainda mais agora que a Copa acabou para os canarinhos. Meu irmão vai viajar, minha irmã continua fazendo as coisas dela. Mamãe faz algumas coisas, costura, trabalha, depois vê tevê comendo um chocolate delicioso ou bebericando licor de jaboticaba (que eu ainda caho muito mais gostoso que vinho). Papai trabalha, como sempre. E às vezes quando entramos no escritório o vemos com aquele seu sorriso engraçado, que sempre parece meio malandro. Lolita está quase tão gorda quanto Tigrinha, e Argus continua esguio, mas todos passam o dia inteiro deitados. Flor e Gatinha continuam dormindo em minha cama. E Carminha lambendo a mão até a carne.
Aqui está um caos. Não o coração, nem a alma, ou espírito, ou barriga, ou o que quer que seja que nos faz seguir em frente. Mas a mente, sabe? Dizem que a casa reflete a mente da pessoa. Pois é...
Minha mente se confunde com a quantidade de músicas que tocam simultaneamente. E as lembranças que se contradizem. E tudo o mais. E a lembrança de cheiros e gostos confusos, como se houvesse sempre alguma razão para se ter fome. Especialmente as consistências, sabe? Meu corpo parece que clama constantemente por elas. Algo que se possa mastigar, como madeira.
Acho que no fundo é o enfado da mente de ter que decidir tudo sozinha. Essa total escassês de sentimentos, impulsos, vontades. Essa loucura de procurar emoções nos livros. E reviver futuros e passados. Sem saber bem aonde se vai. Ou por que se vai. Ou quando. De repente tudo parece tão.. inútil...

Sabe? como flechas disparadas contra o céu, como chutes no ar. Como mover pedras pra lá e pra cá e querer ganhar a melhor fruta. Não significa nada. E eu estou tão cansada de fazer e falar coisas e depois de um banho frio e uma macarronada perceber, sem emoção, que aquilo não significou absolutamente nada. Nada... Talvez no futuro ou no passado tudo tenha sido imensamente doloroso... Talvez tenha tido uma importância muito grande... Mas não hoje. Hoje está tudo bem, tudo bem, e parece que tudo continua como antes. Socorro não estou sentindo nada. E eu queria que você estivesse aqui, pra me encher o saco, pra me abraçar, pra olhar no fundo dos meus olhos e ficar assim profundamente quieto. Qualquer coisa; eu sei que você ainda é capaz de me fazer sentir alguma coisa. O seu cheiro, sabe? impregna em mim cada vez que eu te vejo. E eu sei que o seu cheiro é mais forte que este cheiro de suor, este cheiro de forró que estou sentindo. Eu queria conhecer alguém, eu admito. Eu queria conhecer alguém que abrisse meus horizontes, para além dessa bobagem de escola-cinema-clube-televisão (embora eu não tenha um clube...)
Eu queria conhecer alguém que risse das minhas bobagens, mas que no fundo quisesse ficar comigo uma dessas tardes sentada num banco de praça conversando sobre coisas importantes. E alguém que ralhasse comigo. Que também falasse baizinho, mesmo que de brincadeira. Alguém que tivesse mente aberta e que quisesse me conhecer, que quisesse ver algo diferente, e não sempre as mesmas pessoas. Alguém que me roubasse de mim. Alguém a quem eu pudesse apresentar meus amigos.

"Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar, nem pra rir
Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me entregue suas penas
Já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate, nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Em tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento, acostamento, encruzilhada
Socorro, eu já não sinto nada, nada "

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