quinta-feira, 18 de agosto de 2005

Porque escrevo, sou apenas mais uma dentre tantas que não sabe se pensa, conta, fala ou apenas deslija acidentalmente.

Na verdade todos os deslijes são acidentais.
Desde quando sou admin do Pato?

Bom, vamos voltar ao assunto:

Por que escrevo?

Na verdade esse assunto veio meio por acaso. Originalmente o texto não seria sobre este assunto. Mas o escrever em si é uma arte tão sublime que seria pecado não comentar seus sentidos mais profundos e declamá-los, assintosamente, na mais pública das praças.

Não, não! Escrever é atividade manual. Trabalho braçal. Mecânica bruta. É a criação das frases que se faz sublime. O escrever em si é conseqüência.

Mas o que é escrever? Escrever não é o ato de dispôr palavras, contruindo textos? Ou seria isso falar? Ou seria viver? Através de palavras, concretiza-se a vida.

Talvez não. Talvez seja o mundo maior que eu, que nós todos. Escrever é um registro, minha contribuição para o material dos historiadores do futuro. Estes impulsos elétrico que vos mando, naturalmente, serão em algum momento perdidos. Mas não podemos perder a esperança! Quem sabe, no futuro, o mais distante dos meus descendentes venha a concluir algo de fundamental sobre nossa época, nosso mundo e sua própria vida quando reencontrar o caminho destes símbolos arcaicos?

Ou talvez seja apenas um registro para mim mesma. Talvez eu espere que quando eu tiver a idade de meus pais, estes textos cifrados sejam a chave da minha auto-consciência. Talvez através deles eu consiga resolver todos ou meus problemas emocionais.

Ou talvez eu espere que algum dia eu possa mostrá-los para um psicólogo e perguntar ingenuamente: "O que você acha, doutor? É grave?"

Ou talvez (nisso vocês não pensaram), talvez eu esteja escondendo aqui por meio de um código complexo instruções e anotações precisas do meu plano de dominação do mundo — juntamente, é claro, com a receita do Feijão Azul que aprendi no Livro dos Feijões.

Ou talvez eu me divirta muito com meus próprios pensamentos, e goste de ficar lendo o que escrevo de novo e de novo e de novo tentando compreendê-los, assim como repenso mil vezes cada coisa que faço numa tentativa desesperada (aliás, aficiente) de explicar porque fiz todas aquelas besteiras. Até me convencer de que fiz tudo certo.

Acho que vale considerar que imaginar a reação dos meus queridos amigos quando me lerem pode ser também um elemento de diversão e aventura — algo meio fundamental na minha vida. Sempre fico vagamente apreensiva, pensando em como posso mudar nossas vidas com meras palavras. Mudar me traz uma fascinação terrível.

. . .

Mas acho que nenhuma dessas respostas satisfaz. De fato o mais importante é que eu acho divertido escrever. Gosto de todas as etapas do processo. Gosto de sentir o poder oculto nestes tipos eletrônicos, o qual me permite a comunicação através da rede.
Ouso dizer que escrever para vocês é como tocar para uma cidade de anjos, cujos ouvidos sensíveis compreendem a sutilezas dos quartos e oitavos de notas, e cujas mentes incorruptas não podem extirpar da malodia nenhum mal, nenhuma heresia, por não serem capazes de adivinhar tal vilania; a cidade de santos que dança serenamente a cada ruído melódico que a natureza emite em sua completude.
Mas a cidade dos anjos está em silêncio. Eles não podem falar, pois é muito fresca a lembrança do caído. Eles não vão continuar sua lembrança. Ele deve ser esquecido e enterrado, junto com todos os mortos e perdidos que a cidade possa ter um dia visto tombar.
Evanael. O orgulho de Evanathea. A águia dos olhos dourados, cujo coração era pura bravura e paixão. Cuja paz consistia na perfeição. Evanael. O mais humano dos anjos, cuja sede de conhecer não se saciava com as maravilhas da utopia — para quem a cidade perfeita não era o suficiente. "Eu quero o mundo", dissera ele antes de partir.
"Você tem o mundo, Evanael", responderam os sábios: "O mundo de Evanathea, a verdadeira cidade dos sonhos!"
Mas não adiantou. O que o rapaz queria era a única coisa que ele jamais poderia ter. "Eu não quero sonhos", ele dissera aos sábios; "eu quero a realidade".

Mas o que é real, o que é real??? Viajando por um mundo de demônios, Evan descobre que mesmo fora da cidade dos anjos é impossível encontrar a realidade em sua essência. O mundo que se lhe apresenta é apenas de aparências. Mesmo nas Lápides de Pellasith o anjo encontra apenas dúvidas e mistérios. Antes que possa ouvir o dobrar dos sinos, Evan parte em busca da inocência e da paternidade. Um rapaz muito jovem o atrai com suas mãos cobertas de sangue. Então ele retorna a Pellasith, e as badaladas revelam a ele o sincero e o verdadeiro. Mas seria a verdade a realidade?

Acho que Evan morre antes de cumprir seu objetivo. Mas não acho que ele teria alcançado o moksha se tivesse continuado vivo. Para todos os efeitos, ele ainda é o anjo mau, o anjo pecador. E qual o pecado de Evan?

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