quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Faelyn

O dragão surgiu de repente depois de uma curva, e assomava enorme, quase batendo em todas as paredes da imensa galeria. Era um dragão magnífico, de escamas verdes cobrindo as costelas e placas vermelhas por todo o dorso, brilhando intensamente mesmo na pouca luz da caverna. Suas garras eram do tamanho da espada de Roder, cinzentas e muito mais fortes do que a lâmina. Toda a couraça do dragão reluzia em tonalidades detalhadamente distintas, colorindo as paredes e o chão como um caleidoscópio. Seus chifres eram grandes como árvores, e seus olhos tinham a intensidade de um caçador. Era o dragão perfeito, o monstro de todas as lendas, o inimigo dos sonhos de Roder, Aquele era o dragão definitivo, o dragão com que ele sonhava quando sua irmã lhe contava histórias antes de dormir.
- Nahär! - gritou Roder o nome de seus ancestrais enquanto desembainhava a espada. O dragão levantou a cabeça num susto e se encolheu contra o fundo da galeria, contorcendo o longo pescoço escamoso para virar os olhos para o invasor. Roder, vendo aquela carne enorme se virando e movendo com estradalhaço, ergueu a espada que tinha matado cem ogros e se lançou em corrida para fincar sua lâmina entre as escamas da barriga do monstro. Mas não é tão fácil penetrar o couro de um dragão, e este, tentando espantar o incômodo cutucador, abriu a bocarra cheia de dentes pontudos e rugiu na cara de seu agressor. Mas Roder, em vez de de se assustar com os presas imensas e o rugido ensurdecedor se revigorou com eles e e, convencido de que aquele era o mais terrível e formidável monstro que um herói já enfrentara sem ser devorado, estendeu o braço e enfiou sua espada no fundo da enorme garganta. E o dragão caiu.

Como eu disse, o problema está sempre nos ouvintes. vejo que você me ouve com olhos arregalados e emoção renovada a cada frase, sem imaginar o que acontece a seguir. Também Roder acreditava estar vivendo a estória de sua vida, e nesse momento seu coração batia rápido e sua mente viava pelos cenários do triunfo e das canções dos menestréis. Mas nesse mesmo momento sua visão se desfez.

A bocarra do dragão caíra sobre o herói e o mantinha preso entre as presas e a espada, um dente enorme enfiado no braço desarmado. De repente o espeto dos dentes desapareceu e Roder se desequilibrou e caiu sentado no chão, atordoado mas sem largar a espada. Uma névoa com cor de dragão volteava e revolvia em torno dele, parecendo querer se reunir no centro da galeria logo à sua frente. Entretanto Roder via nitidamente através da névoa, que não tinha cheiro, e não havia vento. Era uma ilusão! Não havia dragão, mas seu braço estava ferido e a espada, suja de sangue. O herói ficou no chão, confuso e paralizado pela percepção de que estivera lutando contra um dragão de mentira. Entretanto, devia haver alguém, quem sabe um demônio ou um vil feiticeiro por trás dessa névoa, pois alguém raptara a donzela, alguém o chamar através da caverna, alguém causara o ferimento no seu braço, e mais - alguém deixara seu sangue sobre sua espada. Roder ficou de pé e avançou lentamente para onde a névoa começava a se compactar numa forma humana, determinado a garantir sua vitória contra quem fosse o vilão de sua história. Ele se postou altivo e ameaçador diante do homem que a névoa formava; mas o homem era na verdade Faelyn, caída e agonizante aos seus pés, numa poça de sangue que saía de sua garganta - e ele desfez a pose e tentou desesperado ajudá-la, mas a garota se esquivou dele apavorada, e seus últimos movimentos neste mundo foram para fugir de seu suposto salvador.

Imagino Roder tentando ajudar a garota, tentando entender onde ele tomara o caminho errado, como era possível que o dragão cruel se tornasse a dozela inocente. E principalmente, como a donzela fôra parar dentro da caverna se ela estava esperando por ele lá fora? Mas não, Roder não parou para pensar nessas coisas, porque era jovem e estava apenas em busca de monstros, não de respostas. A única pergunta que ele fez era onde encontraria o feiticeiro que trocara a vida da donzela pela do dragão, e o que teria que fazer para trazê-lo até o fio de sua espada. E, com seus sonhos de triunfo derramados com o sangue de Faelyn, ele foi buscar seu feiticeiro pelos túneis mais profundos na caverna, que levavam para longe desta cidade.

Um comentário:

Cacau =^.^= disse...

Ola contadora de histórias.
você escreveu algo sobre a continuação dessa?
Histórias dentro de histórias me encantam....
=*