Quero escrever sobre aquelas pequenas tolices que descubro, fascinada, durante o dia: as copas das árvores não disputam espaço; o céu, cantado sempre azul, é muitas vezes vermelho, roxo, violeta. Descobri também, com grande surpresa, que gosto (e me assombro outra vez ao admiti-lo) do cheiro do cigarro. É algo difícil de assimilar, contraditório (mas eu sou mesmo contraditória), que pra mim é estranho compreender. Talvez o estranho seja que minha mãe, que fuma (...), não gosta do cheiro, e eu, que não fumo (e acho que não fumarei nunca) decubro que gosto. Talvez seja alguma associação psicológica, alguma lembrança da infância — cigarro, sítio ou praia, altas árvores, garrafa térmica de água gelada ou de café quente (gosto também do cheiro do café), conversas de família. Talvez o cheiro do cigarro me lembre de conversas muito longas com a Ada, nos sofás da sala em que brincávamos. Talvez... Fico pensando também numa descrição antiga, muito anterior a essa descoberta, que fala de "cheiros de poeira, de sujeira, de pano e cigarro", mas sem nenhuma conotação negativa:
"Tinha um cheiro... estranho. De corpo humano, de pêlos, de pele humana. Cheiro de gente presente, inconcebível em qualquer outro momento. Cheiro de pano e cigarro; impregnado naqueles cabelos que quase se poderiam chamar 'longos'.
Em qualquer outro momento eu repudiaria aquele cheiro. Era um cheiro capaz de me lembrar de doença, de secura, de tosse e desgosto. Porém naquele momento o que eu mais queria era aquele cheiro. Naquela hora o cheiro, tão simples e original, podia remeter à própria origem do cheiro."
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"Cheiro de corpo humano, de sangue, de cerne humano. Cheiro de mãos, de braços, de olhos irrefutavelmente humanos. Cheiro de pêlos, de pele; a expressão mais física do calor humano."
A verdade é que não sei mais do que estou falando. Pensando bem, eu nunca sou exatamente categórica nas coisas, e não me esforço para ser. Não devo mais escrever, devo ir comer. Boa noite, liriidas.
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