("aqui, na escuridão que me cobre como um túmulo, eu conto esta história")
Achei que era apropriado começar com uma citação da peça de teatro (A Morte Trágica de Dois Amantes Muito Infelizes Que Morreram Um de Veneno e o Outro de Dor, Com Vários Incidentes, ou Romeu e Julieta) que nós apresentamos em 2004. Ah, 2004, quinze anos, estar apaixonada. Acho prazeroso estar apaixonada, e com quinze anos isso parecia natural, descomplicado, simples, até o momento em que eu me apaixonei por três pessoas ao mesmo tempo, um com namorada, um gay, um que morria de ciúmes do meu amor pelos outros dois. Vida difícil essa. Essa parte não mudou nada. No fim eu namorei o que tinha namorada, depois com o que não tinha, depois terminei com esse também e decidi não namorar nunca mais, mas meus planos foram impedidos pela existência mágica dos namoros abertos e pela minha incapacidade de não me apaixonar (infelizmente nunca namorei com o que era gay, acho que teria sido o mais feliz dos três namoros).
Ultimamente eu tenho achado tudo muito estranho, e quando eu fico pensativa eu sempre me volto para o passado. Hoje por exemplo sonhei que era colega de classe da Kiki, minha, ahm, melhor amiga de ginásio, uma líder natural forte e decidida e da qual eu nunca soube nenhum dos mêdos e desejos mais profundos. No meu sonho (como, na verdade, na realidade) eu era uma péssima aluna e ficava brincando com ela em vez de fazer a tarefa, e evidentemente quando eu ia fazer a tarefa era tarde demais. Por favor, seja mais explícito, sonho.
Nos últimos treze ou quatorze meses eu não tenho sabido direito quem eu sou. E ao mesmo tempo eu finalmente tenho entendido quem eu sou.
No começo foi confuso e doloroso, meus sentimentos me jogaram de um lado pro outro, eu senti ciúmes, ódio, repulsa, eu dei patadas no meu melhor amigo, eu quis sacanear meu irmão, eu me contive e fui fazer sexo com outra menina, mas logo depois eu já não queria mais seus beijos. Eu fui horrível, eu peço desculpas. Eu queria que eles parassem de ser tão homens, tão bonitos, eu super não sei lidar com gente que é competição mas não é presa. O foda dessa vida gay que eu tenho é que essas pessoas que são só competição são raras, e eu não aprendo a lidar. Fico me perguntando se ser hétero não é um sofrimento constante, competindo o tempo todo, tendo raiva e ciúmes. Eu lembro vagamente do quanto eu amava mais as meninas que queriam ficar com meus homens, just in case, acho que é uma defesa contra a guerra. Sisterhoods e brotherhoods, mas nunca uma siblinghood. Mas é muito mais fácil simplesmente chamá-las junto.
Este vai ser um daqueles textos dos quais eu me envergonho depois de uns meses, aposto.
Estou tomando café só pra conseguir escrever.
Enfim, competir com homens é muito difícil. Eu posso até ser mais bonita que o cara, mas, sabe, ele tem músculos, barba, pica. Não tem muito o que eu possa fazer contra uma pica. O que nos leva de volta ao assunto original do post (na minha cabeça) que é o fato de que eu realmente curto mina hétero. Não minazinha Pat, cabelo comprido e sombra, shortinho, bronzeado e luzes, mas mina macho, de coxa grossa, piercing, dessas que usa coturno com saia, tatuada, que anda de bike, que pega todo mundo, que dança rock pesado e veste sobretudo rasgado, que pinta o corpo, que é brother, que bebe, que manda, feminista, que entende das coisas que entende, que faz arte, que corta o próprio cabelo, que me pega. Mas essencialmente HT. Eu fico meio perdida com lésbicas (e aqui eu estou sendo reducionista, estou dividindo as pessoas entre as que pegam mais homem e as que pegam mais mulher). Pra falar a verdade às vezes eu vejo uma lésbica e penso "mas ela é lésbica, não vai querer ficar comigo". Acho que me perturba o fato de que mulher lésbica de fato gosta de mim como mulher. Mulher ht me pega como se eu fosse um cara, me faz me sentir um cara (enquanto eu elaboro este argumento eu estou de tênis de trilha e calça jeans, sem camisa, eu tenho cabelo curto, 1,58m, e me pergunto se eu sou mesmo diferente do meu irmão), especialmente quando elas parecem não saber muito bem o que fazer com uma mulher, mas ainda assim conseguem me pegar como, sei lá, como pessoa. Mulher lésbica às vezes é feminina demais, me perturba. Me deixa confusa. Me faz me sentir inexperiente, também, talvez isso seja um fator relevante. Talvez tudo seja uma ego-trip gigante. Mas.
Enfim, agora me desçam sua psicologia barata (ou cara, tanto faz).
Mulher que se dá bem com mulher sempre me deixa desconfortável, me faz me sentir menos mulher, menos homem também, menos tudo. Por que a vida é sempre uma competição idiota? Eu me sinto espremida no meio, não sou homem o suficiente pras hétero, não sou lésbica o suficiente pras lésbicas, de vez em quando rola, mas minha cabeça fica cheia de caraminholas. Eu visualizo a sua cara meio que rindo das minha dúvidas adolescentes. Mas você é homem, e eu não tenho grilo com homem, um homem como você não tem grilo, eu nem espero que você entenda por que eu penso essas bobagens.
Às vezes eu penso em mudar de sexo. Queria compartilhar isso aqui. Eu nunca vou fazer, eu acho, mas está constantemente na minha cabeça. Ao mesmo tempo eu não queria de verdade ser homem, ter toda essa auto-confiança excessiva ou esse excesso de auto-piedade que quase todos os homens que eu conheço têm. Eu sou mais bem resolvida que isso. Ainda assim, eu sinto prazer em fazer tudo o que eu puder pra ficar mais masculina. E no dia seguinte usar saia curta e brincos, pork; pork se eu fosse homem eu certamente iria me travestir, pork. Eu lembro de quando eu cortei o cabelo, vesti os brincos e por um momento me achei um transgender me travestindo (depois passou). Eu queria ser mais andrógina, assim como você, Lo. Eu achei tão incrível rolar com você e não saber quais de nós eram homens ou mulheres. Eu queria ter ficado nesse estágio, sentindo essa libertação fantástica. Da próxima vez, quem sabe. Eu não penso em você como um homem, not really. Eu só penso em você como você. Mrrrr.
Nenhum comentário:
Postar um comentário