domingo, 25 de janeiro de 2009

A História do garoto que queria ser herói

Para contar a história da minha voz, é preciso antes contar a história de como conheci o dragão Rolaf, ou seja, a história de como resolvi seguir os passos de Roder, o Grande Herói, quando eu era apenas um menino.
Eu nasci no campo, exatamente como aquela mulher. Acordava cedo para ajudar minhas irmãs no trabalho, e sempre que podia me juntava a outros meninos para explorar lugares perigosos, correr atrás de cachorros e brincar de heróis e vilões. Cresci vendo histórias desenhadas dos grandes cavaleiros matadores de monstros, e recriando nos bosques perto de casa as aventuras que Tia Ida, a irmã velha de meu pai, nos contava nas noites frias. As melhores histórias eram as do grande herói Roder, o fabuloso guerreiro que matara oito dragões e desaparecera dentro da caverna de um nono. Em todas as brincadeiras havia briga para ver quem seria Roder, e eu sempre brigava mais do que todos, porque queria ser um herói de verdade, e não apenas nas brincadeiras. Havia para mim uma única coisa que parecia tão importante quanto viver grandes aventuras e derrotar monstros terríveis — essa coisa era Jennie, a filha do ferreiro, por quem eu era tão apaixonado que até nas brincadeiras com os outros meninos eu sempre jurava lutar em honra dela. Eu lhe dava flores todos os dias e até já havia decidido nosso casamento, quando Jennie desapareceu misteriosamente numa noite sem lua.
Vivíamos numa comunidade muito pequena, e todos ficaram muito preocupados. As tias de Jennie convenceram todas as outras tias de que a garota fora raptada por raposas, em cujo caso seria preciso suborná-las com presentes para que a devolvessem. Os amigos do pai de Jennie, inclusive o meu pai, achavam mais provável que ela tivesse fugido com algum rapaz desconhecido que passara pela região recentemente. Porém a opinião que realmente importava era a dos irmãos de Jennie, e eles logo decidiram que isso era coisa do ogro que vivia no coração da floresta escura atrás da qual o sol sempre se punha. Organizaram-se para uma missão de salvamento sem demora, e eu, que não podia perder aquela aventura, juntei minhas coisas (uma camisa velha, o facão de meu pai, algumas frutas que mamãe deixara madurando num cesto, um estilingue) e fui escondido atrás deles. A caverna do ogro ficava bem mais longe do que eu imaginava. Enquanto os homens armavam barracas de acampamento, eu dormi no chão de folhas úmidas, coberto por galhos quebrados. A floresta era muito mais hostil que os bosques nos quais eu costumava brincar, e era muito difícil acompanhar os irmãos de Jennie sem que eles me percebessem. Depois de três dias chegamos a uma caverna enorme, uma abertura na terra que parecia uma boca aberta, e os irmãos de Jennie largaram suas trouxas, acenderam tochas e pegaram suas foices, machados, forcados e facões para atacar o monstro. Assim que eles entraram, peguei o facão e o bodoque e me esgueirei atrás deles.
A entrada da caverna era uma galeria enorme, que depois ia afinando e afundando e se enchendo de enormes estalagmites. Eu me escondia atrás delas, perto das paredes, para não ser percebido. Quando o corredor ficou muito estreito me deixei ficar para trás, mas em seguida o caminho se dividiu em vários, e eu não sabia mais por onde eles haviam seguido. Segui somente minha intuição, ou minha sorte, e me meti num corredorzinho estreito e sinuoso. Logo percebi que estava sozinho naquele caminho, e ja estava pensando em voltar quando ouvi um urro medonho, que fez todos os pêlos do meu corpo se arrepiarem, e entendi que eles haviam dado de cara com o ogro. Ouvi gritos, urros e barulho de coisas quebrando, e saí correndo na direção deles, para o fundo da caverna. O corredor ficava cada vez mais escuro e úmido, mas afinal eu vi o brilho das tochas dos irmãos de Jennie, e logo depois, vi o que eu esperava ver com o coração pulando e segurando a respiração:

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