quarta-feira, 27 de abril de 2005

A Respeito das Palavras

Confuso. Falar sobre as palavras. Mas diria Iris Murdoch, eu acho, as palavras fazem o mundo ser mundo. "How do you think without words?" Evidentemente há uma certa discórdia a respeito da definição de pensamento. Eu posso afirmar certamente que penso sem palavras, entretanto, de que isso me vale, se algumas pessoas não considerariam isso um pensamento?
Por outro lado, de que me vale um pensamento que não pode ser traduzido em palavras?

Estou ficando com sono. Isso significa que logo estarei dormindo. Em verdade, não pensei isso conscientemente logo de cara: a sensação do sono foi analisada por meu cérebro num círculo inferior de pensamento (para quem não sabe, meu pensamento é circular), formando uma espécie de raciocínio prático, sem palavras mas com muito significado. Logo porém o pensamento emergiu para uma esteira mais superficial na minha mente, em que encontrou as palavras "sono" e "dormir" associadas a uma série de lembranças, cheiros, imagens, gostos, temperaturas, e outras sensações diversas, que combinavam com a sensação inicial, tornando meu sono mais complexo e intolerável. Evidentemente isso fez com que o pensamento saltasse dessa vez para esteiras cada vez mais altas de pensamentos frasais como "estou com sono" e "quero dormir", cujas* significâncias reverberavam cada vez mais alto, até que enfim a frase chegou compreensível e boba a um nível audível na minha mente, numa forma refinada de pouco significado mas muito interessante do ponto de vista da interpretação e absolutamente registrável em palavras, infelizmente para vocês, que podiam estar lendo coisas mais interessantes que eu poderia estar escrevendo agora.

Porém todo esse processo complexo nem sempre acontece. Muitas frases, especialmente as poéticas, são formadas meramente pelo ajuntamento de palavras, pela associação de um verbo e um adjetivo segundo o texto de Machado de Assis, mas sem nenhum significado mais profundo: elas não reverberam, mas remetem a situações tão diversas que são fantasticamente interpretáveis e até certo ponto idiotas, por não significarem nada mais do que você quer que signifiquem. Tornam-se por vezes extremamente vagas, por terem múltiplos sentidos, ou sem sentido, por serem muito absolutas.

E, realmente, eu estou com sono. Boa noite.

*eu estou realmente insegura quanto ao uso desta palavra...

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