segunda-feira, 2 de junho de 2014

Melketh

Um dia um esporo caiu numa poça dágua e começou a germinar.
Uma haste alta de ergueu acima da água e duas cépalas enormes se estenderam da ponta.
Nas cépalas estavam desenhadas duas histórias paralelas, parecidas em alguns aspectos, muito diferentes em outros. Numa delas havia um cavalo branco chamado Lucas, em outra havia um grifo negro chamado Matheus, e coisas assim. Uma dessas histórias era sobre um rapaz. Esse rapaz se transportou para outro mundo e se transformou em quinze pessoas diferentes. Mas cada vez que essas pessoas se separavam, elas começavam a se divdir em outras pessoas, cada vez mais diversas, até que o rapaz era metade da população de um mundo, um mundo muito grande, muito complexo. Nesse mundo as pessoas que eram o rapaz às vezes se recenheciam brevemente, como pessoas que se reconhecem num sonho, sem querer sabendo que aquela pessoa é importante, mas sem saber porquê, ou de repente sabendo o nome dela sem perguntar; essas pessoas se atraíam e se juntavam, mas elas não sabiam que elas eram a mesma pessoa, porqe elas eram tão diferentes. Às vezes uma delas estava pegando um ônibus numa cidade do interior, e quando olhava através do corredor encontrava uma mulher de meia idade que lhe chamava a atenção, alguma coisa no olhar dela, ou no cabelo, lhe dizia que ela pertencia à sua tribo. Essas pessoas viviam sem se conhecer exatamente, mas sabendo que elas pertenciam a alguma coisa, que elas eram iguais e que, se chegasse o dia, elas se ajudariam e lutariam juntas umas pelas outras. Às vezes elas se uniam, em pequenos grpos de amigos ou de amores. Elas se uniam e tinham filhos. Elas levavam a vida, se sentindo ao mesmo tempo desconectadas, como se houvesse algo faltando no mundo o tempo todo, e unidas, como se somente aquelas pessoas, as pessoas mais próximas e aquelas pessoas desconhecidas que também pareciam tão próximas, pudessem compartilhar o qe elas viviam e sentiam e eram. O resto do mundo inteiro parecia estranho e alienígena. Essas pessoas nunca se sentiam realmente confortáveis, porque no fundo elas sentiam a dor de estarem vivendo tão separadas e incompletas. Mas, por outro lado, apenas por estarem separadas é que elas podiam ser tudo aquilo, toda aqela diversidade de coisas tão diferentes e contraditórias, e saber todas aquelas coisas diferentes, e viver todas aquelas vidas diversas. Ser um milhão de pessoas ao mesmo tempo, era difícil, mas elas viviam coisas que uma única pessoa nunca poderia viver. A paz e a felicidade que seria ser uma coisa só e una era compensada pelas incontáveis aventuras e experiências, pela diversidade de sentimentos. Cada pequena sensação, como a beleza daquela luz de fim de tarde que dora ligeiramente o adorno de uma cadeira de um bar de uma esquina, tinha uma aura, uma importância; era sagrado, de certa forma, porque era visto através do sacrifício dessa paz. Essas pessoas sentiam que tinham uma missão na vida, muito embora nunca soubessem exatamente qual. Quase nunca dedicavam sas vidas completamente a um grande objetivo (como viam algumas pessoas externas fazerem), porque seus corações estavam demais envolvidos em apreciar toda a beleza do mundo, e construir o mundo, e às vezes se espalhar e se tornar ainda mais pessoas, com gostos e qualidades e características diferentes, novas, que só seriam possíveis naquele instante, naquele lugar. E essas pessoas mudavam, e adoravam mudar; mas sentiam também uma perda, uma dor de abandonar o que eram antes, como se isso fosse cortar fora uma parte de si mesmo. Mas o rapaz mudava, e se dividia, e se distraía, e se apaixonava, e todas essas coisas eram ele ao mesmo tempo. No final, ele voltou para casa, mas ao chegar lá ele percebeu que se sentia vazio, e sozinho, e que as pessoas pareciam estranhas, e distantes, e que ele não consegia realmente se conectar com elas... Aos poucos ele notou que ele não voltara realmente, e sim que ele se divdira mais e mais até se tornar, em parte, ele mesmo; e que apenas essa parte voltara, e que essa parte estava em casa, no seu mundo, e que nenhuma das outras pessoas era ele, e que todas as outras pessoas eram estranhas e externas e feitas de pedaços de outras pessoas diferentes dele. E ele começou a se esforçar para enxergar no seu mundo as mesmas pequenas beleza -- o sol e o vento e os pequenos detalhes das cascas de árvore e das frases que os padeiros usam nas padarias -- e algumas, às vezes, lhe lembravam um pouco de coisas que ele havia visto no outro mundo... mas algumas eram novas, e eram lindas mesmo assim, e ele tentava se dividir e se tornar muitas pessoas para melhor apreciar todas essas coisas, mas não conseguia. Ele tentou voltar para o outro mundo, mas também não conseguiu. Então, ele continuou vivendo, ainda desconectado e sozinho, tentando o melhor que podia apreciar toda a diversidade do mundo sendo apenas uma pessoa, um aspecto de si mesmo.

A outra história era a minha história.

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