quarta-feira, 18 de maio de 2011

Feminismo e afins (tentatively)

Ultimamente tenho tido dificuldade de parar, pensar, escrever alguma coisa, falar com o mundo, fazer sentido. Estou sempre trabalhando, criando, desenvolvendo, falhando, levando gatos no veterinário, tentando namorar, me sentindo afogada e et cetera.

Vamos parar com isso, eu quero fazer e falar. Qual o tema de hoje?

Ultimamente os temas que tenho discutido têm sido: feminismo, computação, matemática, natureza, rpg, sexo, liberdade sexual, poliamor, lógica, respeito. É, têm sido meio limitado. Tenho saído pouco com a galera, e acho que isso me afasta do nosso ciclo normal de pokémon, biologia, sexo, comida, psicologia, sociologia, religião, rpg, 4chan e fantasia. Mas sobre o que vamos falar hoje?

Tem uma coisa que eu queria falar faz um tempo, que ainda não reuni a coragem e o tempo pra discutir. É essencialmente sobre vocês.

E, sim, eu vou usar "vocês" porque eu sei que vocês vão ler e eu sei que vocês vão saber que é pra vocês. Vocês vão saber, mas leiam sem levantar defesas, da mesma forma que eu leio e ouço vocês mesmo quando vocês falam e escrevem e pensam essas coisas absurdas.

Eu entrei em muitas discussões a respeito de feminismo ultimamente, levantadas pelo contato com gente muito feminista, ora via blogs que na verdade estavam falando de Cups (a propósito, meninas, experimentem usar cups. sério.), ora via #SlutWalk, ora porque alguém no mundo foi estuprado e as pessoas ficaram com dó dos estupradores, ora porque alguém estava irritado com os pedreiros, e pelo menos uma vez porque eu estava irritada com gente que brinca que eu vou fazer greve de sexo, e algumas vezes porque essa discussão começou em quadrinhos como PREACHER ou WalkingDead. E simultaneamente entrei em muitas discussões sobre homofobia e liberdade sexual e afins e todas essas coisas meio que se misturam pra mim.

(obs.: tenho preguiça de pôr links, e vcs sabem o usar o google)

Mas aí eu estou conversando com amigos íntimos meus, e enquanto uma se revolta com uma coisa divertida como Ateímo&Peitos, outro defende que mulher gosta de cantada de pedreiro, e enquanto um praticamente incita a própria namorada a caçar um outro cara, outro sugere que bater na mulher que o traiu não é tão ruim quanto a própria traição que o motiva. Let's get on the same page here.

Quero ressaltar que não estou falando de gente que eu conheço da vida mas que não tem tanto assim a ver comigo. Estou falando de vocês. Vocês inclusive devem saber quem é cada um dos mencionados. Claro que não há apenas um exemplo de cada coisa.

Mas eu quero dizer o seguinte: fotos de mulher pelada não me ofendem. Por que deveriam? Isso não tem tanto a ver com eu gostar de ver mulheres bonitas peladas quanto com o fato de que o corpo humano é uma coisa bela e deve mesmo ser cultuado. Por que não? Um amigo meu entendeu o conceito de academia como uma forma de construir a beleza do próprio corpo, e perdeu os preconceitos. O corpo não é nosso inimigo. O culto à beleza do corpo não é um problema em si. Quando um cara põe fotos de mulheres mais ou menos nuas no seu blog sobre ateismo e peitos, ele não está dizendo que a forma de atrair homens para uma causa é incluir mulher-pelada. Ele só está dizendo "peitos são legais, ateísmo é legal, vou sobrepôr os dois". Você não se ofenderia com "atheism & cute animals". Qual o problema com peitos?

E vocês me conhecem e devem imaginar que está me comendo por dentro essa história de fazer piada com feia ser estuprada, defender o espancador, fazer apologia à cantada de pedreiro, considerar que "slutwalk" só dá mais armas aos machos. Mas vamos separar o material rafinhabastos e o material ciúmes.

Não é novidade que eu considero ciúmes uma coisa idiota, horrível e que sempre acaba em coisa ruim. A literatura me ensinou assim. Mas quando eu cheguei à conclusão de que a lei Maria da Penha não devia ser discutida dessa forma, meu pensamento não foi apenas que "gente ciumenta tem mais é que se fuder". Até porque eu não posso pensar isso quando eu conheço tanta gente de quem eu gosto e que não pode evitar. Meu pensamento foi que, francamente, se uma mulher trai seu marido, e ele se sente traído e sofre com isso, é porque esse casamento tá numa situação totalmente absurda e que não deveria existir. E se o marido se sente tão horrivelmente maltratado que a única solução que ele vê é espancar a esposa, é porque eles deixaram a coisa chegar num estado em que palavras não adiantam nada, em que não há acordo comum, em que quem manda na casa é o mais forte. Isso é considerado machismo, porque o homem costuma ser mais forte que a mulher. E isso costuma estar associado a machismo, porque num casamento patriarcal a mulher tem que ficar quieta e aceitar as ordens do homem, e como pode haver diálogo nesse caso, e como um casal pode se entender se não há diálogo, e como um casal pode estar unido se não se entende? E é claro que a desunião leva a distanciamento, a trapaça, a traição, e quando uma pessoa trai quem não é mesmo do seu time, será que é mesmo traição? E quando um homem espanca a esposa pela sua traição, ele não está apenas sendo um idiota, ele está cumprindo seu papel de homem numa situação em que uma criatura que não é sua aliada tem de qualquer jeito que permanecer sua esposa. Porque ele a ama, é claro, mas não é um tanto infantil ele evocar o seu amor em sua defesa quando, convenhamos, eles não estão lutando lado a lado? Esse amor ciumento é um amor unilateral, um amor que não entende o outro, que não espera pelo outro, que apenas assume, que pretende possuir o outro.

Eu quero confessar uma coisa, pra botar um pouco de peso na discussão. Peço desculpas a todos os envolvidos. Eu briguei com um homem uma vez. E saí machucada. E, porque eu não deixei de gostar do cara depois disso, depois dele me mechucar fisicamente, eu meio que saí acreditando que ele podia fazer o que ele quisesse comigo. Isso durou pouco tempo, porque no dia seguinte eu fui revelar esses sentimentos pra ele e no meio da frase eu mudei prum xingamento e pra raiva e ele começou a chorar e a gente meio que inverteu os papéis e acabou chegando num acordo. Acho que se eu não tivesse me tocado do absurdo do que eu estava falando, eu teria me destruído completamente por causa de um homem. Nós, humanos, somos capaz disso.

Esse foi um dos muitos turning points da minha vida em que eu decidi que não aceitaria nenhum namorado que quisesse me controlar (sim, eu vivo tomando essa decisão). Aquele sentimento de que minha liberdade não tinha a menor importância me deixou tão assustada! Mais do que isso, eu me impressionei com como eu pensei em anular justamente a parte de mim que importa, a parte de mim que luta, que quer ser alguém, que quer mudar o mundo, que é capaz de conquistar alguém e não apenas ser conquistada. Acho que minha conclusão disso tudo é o seguinte: se uma mulher trai seu marido, ou ela não o ama, e aí o casamento é sem sentido, ou a culpa é dele também. Ninguém machuca quem ama sem motivo. E o motivo, bom, você vai saber quando acontecer com você, se você conhecer quem você ama. Amor sem conhecimento nem merece ser chamado de amor. É claro que o motivo pode ser que um vê problema onde o outro não vê, mas isso é um motivo muito forte porque pode ser resolvido com conhecimento. E, aah, como eu sou pouco eloqüênte.

Me estendi muito nesse tema, mas não quero me estender tanto nos outros:

Sobre a piada do RafinhaBastos, alguém devia sugerir pra ele repetir a mesma piada só que trocando estupro de mulher feia por molestação de garotinhos. Eu entendi o humor do cara: sexo é uma coisa boa, mas estupro, que é um tipo de sexo, é ruim; vamos jogar com isso. Faz muito sentido, do ponto de vista humorísco. Exceto que estupro está tão distante de sexo bom quanto tomar veneno está de beber água. Gostei dessa, vamos fazer essa piada: "Um homem do deserto devia agredecer quando recebe veneno pra beber, já que ele tem tão pouca chance de beber alguma coisa" Ou então: "um pobre faminto da somália tem que agradecer se eu o obrigar a comer merda, porque afinal ele quase nunca tem a chance de comer" Ou ainda: "Aquele cara feio devia agradecer por ter sido obrigado a chupar um pau, afinal, ele nunca tem chance de chupar nada". Oh wait. (mas talvez as pessoas riam disso tudo se você for irreverente o suficiente).

Enfim, o que me deixou enojada ao ler a reportagem é o quanto esse idiota se parece com você, que acha ele engraçado. Mas eu não gosto de você menos por isso, só me assusta um pouco. Enfim, espero que pelo menos ele tenha a decência de fazer piadas sobre a sua avó que tem câncer e o seu filho que morreu e todas as outras coisas abomináveis da vida.

Agora, eu estou apoiando a SlutWalk, e acho que se alguma mulher acha que homem que apoia também só quer ver mulher pelada, então essa mulher tem que virar lésbica imediatamente, porque obviamente nenhum homem no mundo presta na cabeça dela. Mais do que isso, se uma mulher acha que se vestir como uma piranha é ridicularizar as putas e fazer piada com assunto sério, então essa mulher provavelmente nunca teve o prazer de se olhar no espelho e achar o próprio corpo bonito e querer deixá-lo à mostra, e ela tem muitos problemas com quem já teve. Estou falando muito sério aqui. E isso não tem nada a ver com se você está dentro dos padrões da moda, só tem a ver com gostar de corpo humano. Porque, embora você talvez não acredite, eu acho o seu corpo bonito. E gostoso, mesmo. E, olha, eu quero que me achem gostosa, então quando eu digo isso, não se ofenda. Não é que eu não tenha critérios, eu sou só uma dessas pessoas que realmente gosta de gente. E, se eu gosto de você, você também deve poder gostar. E você pode sair vestindo sunga ou biquíni ou terno ou vestido ou uniforme de go-go boy, porque o corpo é seu e quem realmente importa é quem te curte.

Estou lembrando agora da revolta que eu senti quando me dei conta de que milhares de mulheres estão num dia quente usando calças compridas unicamente para esconder os pêlos das pernas. Isso me deixou triste, em parte, porque eu quero ter o direito de ver as pernas dos outros. Por acaso pêlo é obsceno?

E sobre a cantada de pedreiro, bom, acho que nem precisa dizer que se uma mulher acha ruim não receber cantada de pedreiro, é porque já se tornou tão comum que as mulheres nem pensam mais na possibilidade de viver sem isso. Mas, quando uma mulher consegue vislumbrar um mundo sem cantadas de pedreiro, acredite, ele é muito, muito melhor. É tipo um mundo em que os caras meio que se importam com qual vai ser a sua reação quando você ouvir o que eles dizem! Isso é tão, tipo, UAU!

'nuff said.

3 comentários:

Utak disse...

Ok, você já tinha me convencido que mulher não gosta de cantada de pedreiro. E quanto aos ciúmes Mali, por experiência prórpia: não é tão fácil ser pouco ciumento quanto é pra você. É muito difícil, eu mesmo estou vivendo isso. Então, não critique muito os ciumes alheio; Critique a falta de capacidade de compreensão que o ciúmes não é culpa do outro, mas culpa do sujeito, afinal, quem sente é o sujeito. Sério, ciúme é inconsciente, e é muito mais forte que as pessoas. Só por que você consegue controlar nao singifica que os outros são obrigdo! (não estou defendendo aqueles que espancam, mas aqueles que gostam de ter a outra pessoa pra si, ou que não suportam ser substituido nem por um minuto) - as pessoas devem superar isso, mas não é fácil assim...

yuribt disse...

pode ser inconsciente, mas é culturalmente produzido e pode muito bem ser modificado.

sobre as imagens de gente nua, o problema nunca foi (pra mim) as pessoas nuas em si, mas um determinado padrão de beleza do corpo que se impõe com tanta força. Por isso tem trabalhos de nus que são lindos de chorar e a pornografia normal que coloca um tipo de corpo como aquele que deve ser cultuado e pasteuriza tudo.

Ozzer Seimsisk disse...

Ugo, eu não gosto de ciúmes, mas não estou discutindo ciúmes aqui. Não condeno os casais que vivem bem com ciúmes. Condeno os casais que são tão desestruturados que se machucam profundamente e acabam resolvendo na base da força. Não estou discutindo o ciúmes, mas a forma de (não) lidar com ele.