Não é à toa que vítima é uma palavra feminina,
eu penso,
toda vez que ouço essas histórias de violência
Enquanto isso um menino é morto espancado
pelo pai
por gostar de fazer coisas - femininas -
como lavar louça -
Enquanto isso uma mulher é levada a réu
violadas todas as ordens de restrição
desamparada
recebeu o ex-marido em casa
a tiros.
--
No meu corpo
as identidades da Mulher e da Vítima
se desafiam
cada uma convicta
se ser a outra.
--
Estrada.
Falam um homem e uma mulher
- nenhum de nós hétero
todos brancos -
sobre uma história de violência que vimos na escola
Ela
fala de trauma
era muito nova
a cena, muito forte
- um grupo de homens violenta uma dona de casa -
Ela sendo mulher
imediatamente se pôs no lugar da vítima
Segura na poltrona e - violada.
- A Espectadora
Passa pelo corpo dela
a violência
de todos os homens do mundo
por todas as mulheres -
Ele
era bastante novo
para nunca ter realmente questionado
a natureza (sua) da violência.
Ele sendo homem
questiona
se colocando no lugar do monstro.
- O Espectador -
"Um ótimo filme", ele diz,
"Todos deveriam ver."
- pelo corpo dele a violência
de todos os homens
- potencial -
Meu corpo,
nem dele nem dela,
Mistura, confunde
as duas experiências
- completa -
meu corpo era velho
precoce
peludo, já
chapéuzinho dentro de lobo
- Vítima - me identifiquei imediatamente com a mulher
, mas
justamente porque arde
visto também a pele e as presas do monstro.
--
Me apavora
imaginar que antes ainda eu
(poderia)
- antes de ter me tornado -
ter nascido vítima
(quão mais assustador)
me tornado mulher através das histórias
Mas é justamente porque dói
que aprecio as histórias violentas.
Com olhos de lobo assisto
a violência
e com boca de lobo pergunto
- é possível domesticar um monstro?
Com nariz de lobo procuro
pessoas
minhas iguais
são as que sangram.
--
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina
Nós homens somos Barba-Azul, Fera, Lobo, Rei-pai ausente e Príncipe Encantado
lutando contra o monstro que somos nós
Nós mulheres somos chapéuzinho, branca de neve, e as esposas do Barba-Azul,
e Bela
assistindo a luta dos homens-monstro
Nós sobrevivemos dos restos deles
transformando-os
ou transformando-nos neles
, mas, para nós, homens, não há essa saída
(essa releitura)
nos monstrificamos e esperamos
uma mulher que nos humanize
que nos redima
e dê sua vida por (para) nós
- Não,
a saída é morrer
ao final de um filme de caubói
monstro até o fim.
- antes morto que feminino -
, mas,
a nós mulheres resta mortalha
ou morte
enterrada em vidro, ou debaixo de casa
derretida por fogo, ou por água
ou casada com o Rei ou o Barba-Azul.
palavra por palavra, procuro chegar, devagar, ao lugar de La Loba.
"O silêncio", disse o griot,"só é escuro no começo..."
quarta-feira, 17 de maio de 2017
sábado, 13 de maio de 2017
A Mulher e a Vítima (primeira versão, sem cortes)
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina,
eu penso,
quando uma mulher é estuprada pelo pai
Enquanto isso um menino é morto espancado
pelo pai
por gostar de fazer coisas - femininas -
- lavar louça -
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina,
eu penso,
quando uma mulher é morta pelo marido
Enquanto isso uma mulher é levada a réu
violadas todas as ordens de restrição
desamparada
recebeu o ex-marido em casa
a tiros.
--
No meu corpo
as identidades da Mulher e da Vítima
se desafiam
cada uma convicta
se ser a outra.
--
Estrada.
Falam um homem e uma mulher
- nenhum de nós hétero
todos brancos -
sobre uma história de violência que todos assistimos na escola
Ela
fala de trauma
era muito nova
e a cena, muito forte
- um grupo de homens violenta uma dona de casa -
Ela sendo mulher
imediatamente se pôs no lugar da vítima
Segura na poltrona e - violada.
- A Espectadora
Passa pelo corpo dela
a violência
de todos os homens do mundo
por todas as mulheres -
Ele
era bastante novo
para nunca ter realmente questionado
a natureza (sua) da violência.
Ele sendo homem
questiona
se colocando no lugar do monstro.
- O Espectador -
"Um ótimo filme", ele diz,
"Todos deveriam ver."
- pelo corpo dele / a violência
de todos os homens
- potencial -
Meu corpo,
que não é dele nem dela,
Mistura, confunde
as duas experiências
- completa
meu corpo era velho
precoce
peludo
(chapéuzinho dentro de lobo)
- Vítima - me identifiquei imediatamente com a mulher
, mas
justamente porque arde
visto também a pele e as presas do monstro.
--
Me apavora
imaginar que antes ainda eu
(poderia)
- antes de ter me tornado -
ter nascido vítima
(quão mais assustador)
me tornado mulher através das histórias
Mas é justamente porque dói
que aprecio as histórias violentas.
Com olhos de lobo assisto
a violência
e com boca de lobo pergunto
se é possível domesticar um -
a violência
Com nariz de lobo procuro
pessoas
minhas iguais
são as que sangram.
--
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina
Nós homens somos Barba-Azul, Fera, Lobo, Rei-pai ausente e Príncipe Encantado
lutando contra o monstro que somos nós
Nós mulheres somos chapéuzinho, branca de neve, e as esposas do Barba-Azul,
e Bela
assistindo a luta dos homens-monstro
Nós sobrevivemos dos restos deles
transformando-os
ou transformando-nos neles
, mas, para nós, homens, não há essa saída
nos monstrificamos e esperamos
uma mulher que nos humanize
que nos redima
e dê sua vida por (para) nós
- Não,
a saída é morrer
ao final de um filme de caubói
monstro até o fim
- antes morto que feminificado -
carregado por valquírias
, mas,
morto o herói
a nós mulheres resta a mortalha
ou a morte
enterrada em vidro, ou debaixo de casa
derretida por fogo, ou por água
ou casada
com Rei ou Barba-Azul.
eu penso,
quando uma mulher é estuprada pelo pai
Enquanto isso um menino é morto espancado
pelo pai
por gostar de fazer coisas - femininas -
- lavar louça -
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina,
eu penso,
quando uma mulher é morta pelo marido
Enquanto isso uma mulher é levada a réu
violadas todas as ordens de restrição
desamparada
recebeu o ex-marido em casa
a tiros.
--
No meu corpo
as identidades da Mulher e da Vítima
se desafiam
cada uma convicta
se ser a outra.
--
Estrada.
Falam um homem e uma mulher
- nenhum de nós hétero
todos brancos -
sobre uma história de violência que todos assistimos na escola
Ela
fala de trauma
era muito nova
e a cena, muito forte
- um grupo de homens violenta uma dona de casa -
Ela sendo mulher
imediatamente se pôs no lugar da vítima
Segura na poltrona e - violada.
- A Espectadora
Passa pelo corpo dela
a violência
de todos os homens do mundo
por todas as mulheres -
Ele
era bastante novo
para nunca ter realmente questionado
a natureza (sua) da violência.
Ele sendo homem
questiona
se colocando no lugar do monstro.
- O Espectador -
"Um ótimo filme", ele diz,
"Todos deveriam ver."
- pelo corpo dele / a violência
de todos os homens
- potencial -
Meu corpo,
que não é dele nem dela,
Mistura, confunde
as duas experiências
- completa
meu corpo era velho
precoce
peludo
(chapéuzinho dentro de lobo)
- Vítima - me identifiquei imediatamente com a mulher
, mas
justamente porque arde
visto também a pele e as presas do monstro.
--
Me apavora
imaginar que antes ainda eu
(poderia)
- antes de ter me tornado -
ter nascido vítima
(quão mais assustador)
me tornado mulher através das histórias
Mas é justamente porque dói
que aprecio as histórias violentas.
Com olhos de lobo assisto
a violência
e com boca de lobo pergunto
se é possível domesticar um -
a violência
Com nariz de lobo procuro
pessoas
minhas iguais
são as que sangram.
--
Não é à toa que vítima é uma palavra feminina
Nós homens somos Barba-Azul, Fera, Lobo, Rei-pai ausente e Príncipe Encantado
lutando contra o monstro que somos nós
Nós mulheres somos chapéuzinho, branca de neve, e as esposas do Barba-Azul,
e Bela
assistindo a luta dos homens-monstro
Nós sobrevivemos dos restos deles
transformando-os
ou transformando-nos neles
, mas, para nós, homens, não há essa saída
nos monstrificamos e esperamos
uma mulher que nos humanize
que nos redima
e dê sua vida por (para) nós
- Não,
a saída é morrer
ao final de um filme de caubói
monstro até o fim
- antes morto que feminificado -
carregado por valquírias
, mas,
morto o herói
a nós mulheres resta a mortalha
ou a morte
enterrada em vidro, ou debaixo de casa
derretida por fogo, ou por água
ou casada
com Rei ou Barba-Azul.
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