segunda-feira, 31 de maio de 2004

Alabarda


Vocês vão me perguntar ou não eventualmente ou não a razão do título e, pela primeira vez em algum tempo, eu vou saber como vos responder. Eu sinto essa lança fincada no peito, dilacerando minha gana de viver e amar, cada vez mais intensamente, até que o coração exploda, ou seja rompido. Bom meu coração não foi partido, ninguém me traiu, não tenho nenhum cara para amar e odiar ao mesmo tempo. Mas tenho todos.

Minha miséria consiste em amar, amar demais. Talvez alguns de vocês já tenham compreendido isso, talvez alguns um dia compreendam. Mas eu tenho frio, eu tenho medo, um vazio na alma que quer, juro que quer, ser preenchido. Mas não pode. As pessoas que poderiam estar aqui não estão. Às vezes acho que nunca vão estar. Eu sinto uma falta desgraçada daqueles espaços vazios. De ficar à toa no colégio, esperando a próxima aula por hora e meia, escrevendo poemas sobre mim mesma, e poesia sobre o mundo, que era belo. Sinto como cinza quente a saudade daqueles tempos de ficar dias inteiros desenhando, rodeando a água da piscina(muito mais pura que a piscina em si), conversas longas nos galhos da Spectri, canções da perua da Ação — bem antes do Ônibus Mágico aparecer por lá —, rir entre amigos, e principalmente não ligar para nada. Eu queria ser animalmente, bichalmente insensível, como uma vez eu fui.

Eu sei, eu posso dizer que o Encontro de Jovens mudou minha vida. Cheguei em casa no domingo carente, precisando de abraço, de carinho. Com medo de não ter aquilo de novo nunca. Na segunda-feira, digo que ser funcionária foi muito mais difícil que em todas as outras before, e ainda assim, desta única vez não recitei aquele poema inteiro. Não tive vontade de recitar. No recreio é verdade que saí procurando a gente do Encontro, que elas se destacavam da multidão. É verdade também que foi aí que resolvi reacende velhas amizades; abracei com força cada amigo verdadero, cada criatura que eu amava, ri porque as lágrimas que cobriam meus olhos eram nem de dor nem de alegria, mas de amor! Só isso... Não sei nem como explicar o que eu senti e o que sinto... Mas relacionar as duas coisas me facilita muito...

"Ando tão à flor da pele
que qualquer beijo de novela me faz chorar
ando tão à flor da pele
que seu olhar flor na janela me faz morrer
Ando tão à flor da pele
que meu desejo se confunde com a vontade de nem ser
ando tão à flor da pele
que a minha pele tem o cheiro do juízo final

Barco sem rumo, sem porto, sem vela...
Cavalo sem sela...
Bicho solto, tão sem dono, menino bandido,
Às vezes me preservo, noutras suicido..."


E é verdade que não precisa muito esses dias para me fazer chorar...

Embora eu acho que beijos alheios, numa boa...

São as mãos que eu invejo, no final...

É tudo uma questão de saudades...

E sábado... Eu acho que sábado foi a expressão mais profunda desse carinho, esse amor contido e absurdo pelos meus verdadeiros amigos! Não que eu nunca tenha amado meus amigos como se não pudesse sobreviver sem eles, mas nunca nesse nível, entende? Quando a Sofia foi embora com aquele bando, eu me despedi dela quase chorando. Na segunda leva, foi menos mal. A Gabi foi deixando saudades profundas. A terceira leva... é que a terceira foi o Luque com o Diogo. E eu estava já bizzarramente attached a eles nesse dia. Além disso, eu estava lá no cobitô entre o Charles e o Luque, decidindo para que lado eu ia pender — felizmente eu nem tive que fazer a opção, thee-hee —, porque eu 'tava com frio e muito carente de ficar junto naquela hora, e sinceramente eu já me acostumara com aquela formação tão aconchegante. Depois disso ninguém mais foi embora. De alguma forma convencemos o John a ficar e dormimos nums colchões no chão, com quatro cobertores, só isso. Ponto.

Mas tudo aquilo mexeu comigo. Depois do Encontro, eu é que procuro a flor nessa náusea profunda. É feia, mas é uma flor. Será? Qualquer coisa é intensa e, para mim, dogmaticidade é uma coisa que dizem que eu também tenho. Mas a verdade é que eu não sei de nada. Eu tento, mas não sei de nada. Eu crio definições e no fim do dia, vai no fim da semana, já não consigo usá-las. E às vezes eu opto pelo mais fácil, mas, como isso me ajuda? Eu nem sei o que é o amor, para falar dele assim....

Nessa segunda-feira, ser funcionário é completamente impossível.
Mas não há para quem eu possa telefonar e pedir conselho....
E não é lá fora, a noite escura ou o dia hipócrita, que me fazem sentir assim.
É a dor das coisas reverberando fundo. O luto desta mesa.

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